por Simoni Aquino
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Fonte da imagem: www.diasemfoco.com.br |
Há uma semana, a tragédia que dizimou a delegação da Chapecoense, parte da
tripulação e profissionais da imprensa, passou a fazer parte de nossas vidas de
alguma forma, pois à todo momento, independente do veículo de comunicação, nos
deparamos com notícias que envolvem esse triste acontecimento.
E com isso, vamos tomando conhecimento de histórias de vida, de detalhes
desconhecidos dos vitimados e dos sobreviventes, seja uma curiosidade, um
sonho, um acontecimento ou uma passagem interessante de vida.
Não há como não
se comover com tanta vida perdida e não pensar no que todos ainda teriam para
realizar: o jogador Tiaguinho que havia descoberto recentemente que seria pai, o narrador Deva Pascovicci que de forma valente havia vencido dois cânceres, o comentarista (ex-técnico e ex-jogador) Mário Sérgio que não iria cobrir esse
jogo mas foi escalado de última hora, o filho do técnico Caio Junior que não
embarcou por ter esquecido o passaporte, dentre tantas e tantas comoventes histórias de vida, especialmente quando lembramos que se tratavam de profissionais em viagem, a fim de exercer seus respectivos ofícios de forma vibrante e profissional.
E diante disso tudo, a Chapecoense que já vinha em uma ascendente projeção
nacional desde 2009, passou a se tornar um time de dimensões internacionais.
Para quem como eu que acompanha futebol já sabia que o motivo dessa ascensão,
considerada meteórica, se dava fundamentalmente à sua gestão responsável e consciente e hoje como
toda essa repercussão, fica a torcida de que o sucesso dessa gestão torne-se um legado
para os dirigentes que restaram, que deverão promover uma restruturação para
que o clube possa se reerguer e que essa tragédia tenha o menor impacto
possível.
Para que todos possam compreender as lições de gestão da Chapecoense é
necessário voltar um pouco no tempo, em 2008, quando o paranaense Sandro
Luiz Pallaoro, empresário do ramo de alimentos em Chapecó, aceitou o convite
para presidir a Chapecoense e assim, levou toda a sua expertise executiva para
a administração de um time de futebol e dá-se o início uma avassaladora
ascensão, nunca vista antes no futebol nacional.
O Diretoria de Conselho, que normalmente em outros clubes apenas fiscaliza os
trabalhos da Diretoria Executiva, na Chapecoense atuam em conjunto e isso
proporciona um ganho significativo e uma sinergia nos trabalhos de ambas diretorias
em prol de uma gestão responsável.
Entre 1973 - ano de sua fundação até 2008, a Chapecoense passou por muitas
situações, desde momentos de conquistas de três campeonatos catarinenses nos
anos de 1977, 1996 e 2007 até sérios problemas financeiros que obrigaram a
Chapecoense a mudar de nome e personalidade jurídica para saldar dívidas em
2003.
Essa ascensão entre 2009 e 2014 foi considerada avassaladora e o mais
surpreendente nessa história é que a permanência de um time médio, de forma tão
consistente na elite do futebol é incomum, e a Chapecoense tem se mantido de
forma muito digna na série A, o que reflete a eficiência e a eficácia de sua
gestão.
Em 2008, a Chapecoense contava com um orçamento de 9 milhões de reais (pouco
para o mundo do futebol nacional) e 300 associados e embora fosse campeã
catarinense por 3 vezes, só havia disputado o campeonato brasileiro nos anos de
1978 e 1979 e só retornaria para a série A em 2014, quando passou a administrar
um orçamento de 35 milhões de reais, contando em 2016 com um orçamento de 60
milhões de reais.
A gestão do presidente Pallaoro era baseada em 4 pilares: planejamento, comprometimento, responsabilidade e transparência. E tinha como premissas manter o equilíbrio
financeiro tratando o clube como um negócio com uma gestão responsável para dar
lucro e investir em benefício da própria equipe principal e de base e na
estruturação do clube, a política salarial do clube é baseada em piso de 30
mil reais e teto de 100 mil reais, premiações por metas alcançadas e pela
primeira vez, o clube premiaria a equipe com o pagamento do 14º salário,
incomum no futebol nacional e característico em empresas privadas estruturadas
financeiramente.
Os 4 pilares e as premissas trazidas do mundo corporativo fizeram toda a diferença para o
impressionante crescimento da Chapecoense em 7 anos e a consequente permanência
do time na série A por 3 anos consecutivos, e o mais incrível, sem rondar a
zona de rebaixamento em nenhum dos últimos anos, diferentemente do que vem
acontecendo com clubes de maior renome, visibilidade e orçamento. Conquistando
vaga para disputar a Copa Sulamericana, seu primeiro torneio internacional e
hoje, com a notícia da chancela da Commenbol em atribuir o título da
Sulamericana à Chapecoense – como proposto pelo Atletico Nacional da Colômbia,
pela primeira vez no próximo ano o time de Chapecó irá disputar a Taça
Libertadores.
Uma prova de que, grandiosidade do clube, marca forte,
orçamento gigantesco e grandiosos títulos não garantem uma boa colocação em
campeonatos e não evitam rebaixamentos. O que faz toda a diferença em tempos de
alta profissionalização do futebol é a sua gestão. Uma administração forte, responsável,
profissional, composta por pessoas sérias e comprometidas com o todo, ou seja,
com o clube.
E por que o mundo corporativo deve levar o exemplo da
Chapecoense, uma vez que o clube se inspirou em administrações corporativas
para sua gestão? Resposta simples essa!
Simplesmente porque existem muitas... mas muitas empresas
de pequeno e médio portes que ainda não possuem uma gestão nestes moldes.
Até tentam, mas a cultura da “amizade”, a cultura do “todo
mundo faz tudo de qualquer jeito e no final dá certo”, a cultura do “dono que
dá pitaco em tudo”, a cultura do “dono que desautoriza seus líderes”, da
cultura do “jeitinho brasileiro”, da cultura do “quem manda aqui sou eu”, a
cultura do “manda quem pode e obedece quem tem juízo”, a cultura do “atropelo”,
a cultura do “reduzir quadro para quem fica dar conta do serviço de meia dúzia”,
da cultura “coleguismo”, da cultura do “protecionismo por camaradagem ou
gratidão”, da cultura de “regras existem para serem quebradas”, do “passar a
mão na cabeça de profissionais desrespeitosos, mas que dão resultados”, enfim,
ficaria o dia todo elencando fatores comuns em determinadas empresas neste
vasto mercado de trabalho.
Tudo isso em detrimento das competências, da reciclagem,
da qualificação, da capacidade de liderança, da capacidade de gestão, da visão
macro, da visão holística, da responsabilidade corporativa, da transparência
organizacional, do alinhamento financeiro, da ética empresarial, do respeito
aos colegas de trabalho, de respeito às hierarquias, entre tantas outras.
Você, conhece empresas assim? Já passou por alguma empresa assim?
Certamente, todos nós em algum momento de nossa trajetória profissional já atuamos em empresas com esse tipo de gestão.
Quando o ex-presidente da Chapecoense deixa seu legado de
planejamento, comprometimento, responsabilidade e transparência, ele nos demonstra
o quanto o mundo corporativo ainda tem muito a aprender com ele. Pois esses 4
pilares são fundamentais para combater essas culturas corrosivas, que dinamitam
a Gestão de Pessoas e a Gestão Financeira de qualquer empresa.
Torço para que a nova diretoria da Chapecoense faça jus à gestão de
Pallaoro e prossiga com uma gestão responsável e transparente para que o clube
sinta o menor impacto possível e consolide seu crescimento em nome dessa
delegação dizimada por essa triste tragédia. E que o restante do mundo
corporativo possa se espelhar na Chapecoense para que reflita sobre sua gestão,
seu modelo de estratégia organizacional e se inspire no que de bonito a
Chapecoense nos ensinou.
Deixo esse texto como reconhecimento de uma administração modelo até para o mundo corporativo e fundamentalmente, como uma homenagem para a Associação Chapecoense de Futebol.
#ForçaChape
Obs.: O próximo texto, que sairá ainda essa semana, será uma análise sobre a empresa de fretamento aéreo Lamia, responsável pelo vôo da Chapecoense.
Abraço e até a próxima!